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A guerra do imperialismo americano contra os Brics

Artigo atualizado em 13 de julho de 2025.

A guerra de Israel contra o Irã teve como objetivo declarado a desnuclearização do país persa. O Irã é para Israel uma ameaça existencial porque não aceita o estado de Israel em sua configuração colonialista e racista e que opera como uma cunha do imperialismo no Oriente Médio. O Irã configura um foco de resistência contra a expansão colonialista do regime sionista de Israel na Palestina e o genocídio do povo palestino. E diferentemente das monarquias árabes sunitas da maioria dos países do Oriente Médio, que se submetem aos ditames do imperialismo americano e europeus, a revolução de 1979 no Irã colocou no poder em Teerã um regime teocrático chiita que não se submete aos ditames imperialistas e coloca a soberania nacional como princípio fundamental do estado.

Para Israel, portanto, o Irã representa uma ameaça e busca há décadas a destruição do regime iraniano. Mas, para uma guerra frontal contra o país persa Israel necessita do apoio do império americano, o que vem conseguindo agora no segundo governo de Donald Trump. Em seu primeiro governo Donald Trump já havia rompido o acordo nuclear no qual o Irã havia assumido o compromisso de não construir armas nucleares, mas fazer uso pacífico da energia nuclear. Mas, agora, mesmo comprovado pelo organismo da ONU responsável pelo controle da não proliferação de armas nucleares, tratado do qual o Irã é signatário (Israel não), de que o Irã não possui armas nucleares e não está em vias de produzi-las, o presidente americano autorizou os ataques israelenses contra o Irã, inclusive suas centrais nucleares.

Quais são, então, as razões não declaradas do governo americano para autorizar e apoiar a guerra de Israel contra o Irã? E apoiar a estratégia de mudança do regime de Teerã, apesar de seus posicionamentos públicos contra a política dos governos anteriores, especialmente democratas, de intervenções militares para impor a mudança de regimes políticos em diversos países?

A crise econômica é hoje muito mais profunda que no período do primeiro governo Trump e ameaça a estabilidade social e política do mundo capitalista. O endividamento dos principais países capitalistas está em níveis insustentáveis. A dívida pública norte americana alcançou a cifra astronômica de 36 trilhões de dólares, e assim como o déficit comercial, de quase um trilhão de dólares anuais, estão em nível descontrolado. A Isto se soma o processo de desindustrialização dos EUA, o nível de vida em queda e precarização crescente nas relações de trabalho. O governo Trump, neste contexto de crise profunda, busca desesperadamente diminuir o déficit público, com a política de cortes drásticos de gastos governamentais nas áreas sociais, assim como a aplicação de tarifas monumentais nas importações americanas com todos os demais países objetivando a diminuição rápida e drástica dos déficits comerciais. Junto com estas medidas os governos americanos, desde bem antes do governo Trump, já vem usando e abusando de sanções econômicas, totalmente ilegais, contra diversos países (Irã, Rússia são os mais destacados exemplos), mas também contra as empresas chinesas de tecnologia que vem ameaçando a hegemonia americana neste segmento nos principais mercados.

Diante destas medidas ilegais que rompem com o livre comércio e a livre concorrência no mercado internacional, os países mais afetados tem buscado alternativas contra a aplicação das sanções americanas (também europeias), assim como a aplicação extraterritorial em escala crescente de leis americanas. O movimento mais significativo na direção da articulação de um bloco de países que não aceita se submeter aos ditames e chantagens dos países imperialistas é o dos BRICS, que não somente tem se articulado no campo das relações comerciais como também na criação de mecanismos não sujeitos aos controles das movimentações financeiras entre países (com substituição do SWIFT como sistema de pagamentos) e a substituição do dólar como única moeda de troca nas relações comerciais internacionais.

Os BRICS passaram a ser para o imperialismo americano e europeu um bloco que constitui séria ameaça para a hegemonia financeira do capital americano e europeu e para o comércio dos países que fogem ao seu controle. O governo Trump não só continua com as sanções anteriormente já aplicadas contra o Irã, assim como continua no apoio ao regime neonazista ucraniano na guerra contra a Rússia, dando plena continuidade à ofensiva da OTAN contra a Rússia iniciada com o golpe em Kiev em 2014. E também ampliou drasticamente a aplicação de sanções contra as empresas de tecnologia chinesas, além da política de tarifas draconianas contra a importação e produtos fabricados na China. Mas, além da guerra multidimensional contra a Rússia e a guerra econômica contra a China, o governo Trump incluiu em sua agenda uma ofensiva contra a África do Sul que vem sofrendo pressões e chantagens, com mentiras escandalosas contra o governo sul-africano e aplicação de tarifas draconianas de importações.

A guerra de Israel, apoiada pelo governo americano, contra o Irã é mais uma ofensiva criminosa contra um país integrante dos BRICS, com claras intenções de impor uma mudança de regime político que se submeta aos interesses americanos. Não podemos deixar de considerar que o Irã é um país rico em petróleo, gás e terras raras, que sempre estiveram na alça de mira das corporações imperiais. Mas, não só isso. Com o avanço da articulação dos BRICS, o Irã passou a ser um importante componente da logística econômica dos países da Ásia, com fortes investimentos em infraestrutura de transportes que envolvem o trânsito de mercadorias da China em direção à Europa, passando pelo Paquistão e Irã. Em abril de 2025 foi inaugurada a ferrovia que liga a cidade de XI’na na China ao porto seco de Aprin no Irã. Um projeto que diminuirá os prazos e custos do transporte de mercadorias e aumentará a presença chinesa na região. Da mesma forma, o eixo de transportes norte-sul que vai da Rússia até a India, passando pelo Irã e Paquistão será outro fator de integração regional. Portanto, o Irã está se tornando um importante nó da integração econômica da Ásia e, da Ásia com a Europa.

A única conclusão que podemos tirar da intervenção militar direta dos EUA na guerra de Israel contra o Irã é a estratégia de guerra dos EUA contra os BRICS. Israel tem seus objetivos próprios na mudança de regime em Teerã, relacionados com sua perspectiva expansionista e genocida contra o povo palestino, mas, os objetivos dos EUA vão além do simples apoio ao regime sionista de Israel. Os EUA estão em uma ofensiva em grande escala e multidimensional contra os BRICS. A destruição do Irã, ou a implantação de um regime submetido aos interesses imperiais americanos, é um importante elemento desta ofensiva. O grupo BRICS é uma ameaça à hegemonia imperialista e precisa, para impedir sua consolidação e ampliação, ser inviabilizado.

Com exceção da India, todos os demais países que constituem o núcleo central dos BRICS estão sendo atacados direta ou indiretamente. Inclusive há sérias dúvidas se o recente conflito entre India e Paquistão não foi derivado de ações provocativas de grupos terroristas instrumentalizadas e apoiadas pela CIA ou o MOSSAD com o intuito de provocar uma guerra da India com o Paquistão e que pudesse envolver também outros países da Ásia, especialmente a China. As declarações recentes de Netanyahu com ameaças de atacar também ao Paquistão é bastante sintomático neste sentido.  

Rússia e China assumiram posição unificada na denúncia contra os ataques de Israel e contra os ataques americanos contra as centrais nucleares do Irã. E, embora não se envolvendo diretamente no conflito ao lado do Irã, certamente tiveram um papel para o cessar-fogo. O apelo do Aiatolah Ali Kamenei ao presidente Putin, pedindo apoio, em mensagem levada pelo Ministro das Relações Exteriores do Irã um dia após os bombardeios das três centrais nucleares (Fordow, Isfahan e Natanz) pelos EUA, indicava que a continuidade do conflito poderia levar a uma escalada com um envolvimento da Rússia no conflito. No dia 24 de junho, dois dias após os bombardeios e um dia depois da visita ao governo russo, os EUA declararam um cessar-fogo que deveria ser obedecido Tanto por Israel como pelo Irã.

Apesar da forma estranha em que se deu o cessar-fogo, após o bombardeio americano nas centrais nucleares e uma tentativa de ataque do Irã com mísseis à base aérea dos EUA no Catar (ataque sem consequências), algumas constatações sobre o conflito são importantes de ressaltar:

1) o Irã sofreu duros golpes nos primeiros dias dos ataques israelenses com a destruição de grande parte da defesa antiaérea, o que permitiu o êxito dos bombardeios israelenses, tanto pela ação de grupos de agentes dentro do território iraniano como com os bombardeios, o que indica uma precariedade na segurança interna que não contava com a atuação de iranianos ao lado do MOSSAD nos ataques que também eliminaram oficiais de alta patente e cientistas nucleares e, possivelmente, um excesso de expectativas do governo em relação ao processo de negociações em curso com os EUA sobre o programa nuclear iraniano;

2) que apesar destes duros golpes o Irã conseguiu rearticular sua estrutura de comando e reagir aos ataques com contra ataques exitosos de mísseis contra o território israelense, vencendo o sistema de defesa antimísseis de Israel e atingindo alvos estratégicos tanto em Tel Avic, Haifa e Nez Ziona, assim como várias bases militares, obrigando a população das principais cidades a constantemente refugiar-se em abrigos e paralisar a atividade econômica;

3) o amplamente elogiado sistema de defesa antiaéreo de Israel evidenciou amplas fragilidades e deficiências, com aproximadamente 40 mísseis iranianos furando o sistema israelense e colocando em risco as instalações do centro nuclear de Negueve e o próprio estado israelense, com uma eventual escalada e prolongamento do conflito;

 4) a perspectiva de queda do regime islâmico de Teerã mostrou-se algo completamente irreal e, ao contrário do esperado pelo regime sionista de Israel e dos EUA, diante dos ataques ao país a população iraniana se uniu contra a agressão e, tudo indica, levou ao fortalecimento do regime;

5) o ataque americano às centrais nucleares iranianas evidenciou para o mundo que o conflito não era entre Israel e Irã, mas de Israel e EUA contra o Irã, o que levou ao regime de Teerã a buscar apoio em Moscou indicando que o país estava diante de uma ameaça existencial, com possibilidade inclusive de uma escalada com ataques nucleares;

6) o cessar-fogo foi, neste contexto, uma saída para evitar um conflito de grandes proporções, com envolvimento de outros países, inclusive possuidores de armas nucleares.

Muito provavelmente o governo Trump sentiu que havia, tanto de parte de Israel como das agências de inteligência americanas, uma avaliação equivocada sobre as capacidades militares do Irã e também das capacidades de defesa de Israel que não resistiram aos mísseis iranianos. Ademais, ainda que a Rússia e a China pudessem não intervir diretamente, certamente seriam levadas a um apoio ostensivo ao Irã o que tornaria qualquer vitória impossível no conflito que poderia derivar para uma guerra regional de grandes proporções no Oriente Médio. A opinião pública mundial teve também uma reação imediata muito forte contra os ataques sem motivo ao Irã evidenciando um processo de isolamento internacional de Israel e dos EUA. O cessar-fogo foi neste contexto um recuo tático do imperialismo.

Há, porém, outros aspectos relevantes a considerar com este conflito. Em primeiro lugar, a constatação da necessidade de um aprofundamento da parceria estratégica entre os países componentes do BRICS. É evidente que a crise do sistema capitalista está levando a ações cada vez mais agressivas do imperialismo e seus agentes regionais. Ao mesmo tempo, se observa claramente a total submissão dos países da União Européia a política agressiva do imperialismo americano. Isso se expressa de forma cristalina no caso do conflito russo-ucraniano, no genocídio do povo palestino, e também na América Latina com o apoio ostensivo às sanções econômicas e as políticas golpistas em relação aos governos que se enfrentam ao imperialismo como Venezuela, Bolívia, Nicarágua e Cuba. Sem falar no caso resistência ao colonialismo e dominação imperialista na África. A resistência anti-imperialista e colonialista está atualmente inteiramente colocada nos ombros do bloco dos BRICS.

Até o momento os BRICS, assim como a Organização de Cooperação de Xangai, não se constituem como bloco militar. O caso do Irã mostra, entretanto, que isoladamente os países que integram o bloco não conseguem enfrentar a ofensiva imperialista. A Coréia do Norte compreendeu isso e assinou um acordo de cooperação estratégica com a Rússia que envolve a defesa mútua em caso de conflito. Segundo declaração de Vladimir Putin, ao ser perguntado porque a Rússia não está ajudando o Irã no conflito com Israel, teria sido uma opção do regime iraniano. E, de fato, o acordo de cooperação estratégica da Rússia com o Irã (que não envolve o componente militar em caso de conflito, diferentemente do acordo com a Coréia do Norte), foi assinado pelos dois governos em janeiro de 2025, mas somente foi votado pelo parlamento iraniano já durante o conflito com Israel, aparentemente de forma apressada.

Há uma cooperação entre Rússia e Irã no que se refere à venda de equipamentos militares, assim como há compras iranianas da China. Mas, o regime de Teerã parece estar excessivamente confiante em suas próprias forças e um zelo muito grande em relação ao conceito de soberania para não aceitar acordos mais avançados em termos de defesa. Isso é, sem dúvida, compreensível considerando a nefasta experiência do regime autocrático e colaboracionista do Shah Reza Pahlevi, que governou o Irã com apoio do Reino Unido e dos EUA, de 1953 a 1979, quando foi deposto pela revolução islamita liderada pelo Aiatolah Khomeini. No entanto, conflitos regionais não tem a dimensão do enfrentamento da ação militar direta do imperialismo americano. No contexto atual de crise global e enfrentamentos que envolvem as grandes potências, a soberania do Irã (e outros países que não possuem a capacidade de dissuasão contra potências nucleares) só se garantirá com o apoio do poder de dissuasão da Rússia e da China. Da mesma forma que o apoio da União Soviética foi fundamental para a sobrevivência da Cuba revolucionária na década de 1960.

 As articulações para o fortalecimento da defesa do Irã se acelerou com novas reuniões com o Ministério da Defesa da Rússia e com a China. O cessar-fogo não significa o encerramento do conflito. As ameaças de novos ataques e bombardeios, tanto de Israel como dos EUA, continuam. O imperialismo continua armando Israel que continua seus ataques contra o povo palestino, assim como no Líbano e na Síria. A Europa continua seu projeto de rearmamento em grande escala com a aprovação dos investimentos de 5% do PIB em defesa exigidos pelo governo Trump. Os EUA, além de exigir investimentos massivos da Europa em defesa, aprovaram a “grande e bela lei” do governo Trump que aumenta os gastos em defesa e autoriza o aumento do limite da dívida pública em mais cinco trilhões de dólares. É um processo gigantesco de preparação para os conflitos que o imperialismo considera como inevitáveis para impedir a perda da hegemonia global do império americano.

Enquanto o endividamento cresce a patamares cada vez mais insustentáveis a perda de credibilidade e confiança no dólar como moeda mundial de reserva também cresce. O risco de calote aos detentores de títulos do tesouro americano começa a assustar os mercados. Ao confisco de bilhões de dólares da Venezuela se soma já agora as tentativas mais audazes de confisco dos mais de trezentos bilhões de dólares da Rússia depositados em bancos europeus e americanos. A aplicação de sanções econômicas ilegais, a chantagem como política de estado nas relações internacionais, as tarifas comerciais protecionistas, tudo se mostra incapaz de evitar o colapso do sistema financeiro estruturado pelo capital americano e a queda do poder imperial global. A receita como sempre é tentar a solução pela força militar, com a destruição de gigantescas forças produtivas construídas pelo trabalho humano e a perda de milhões de vidas humanas.

O desespero diante da crise estrutural do sistema capitalista é uma ameaça a todos os povos. O imperialismo só recuará se a cada nova ofensiva houver uma resposta decisiva de resistência.

Todo apoio ao Irã na sua luta contra os ataques do imperialismo e seus agentes regionais!

Todo apoio ao povo palestino contra a ofensiva genocida de Israel apoiada pelo imperialismo!

Todo apoio aos países da África que lutam contra o colonialismo e pela independência plena!

Todo apoio aos países da América Latina que lutam contra as interferências econômicas e políticas imperialistas e em defesa de sua soberania nacional!

Fora OTAN da Ucrânia e de todo o leste europeu!

  • Teve sua inicialização política no movimento estudantil secundarista na resistência à ditadura, no interior do Rio Grande do Sul. Após mudança para o Rio de Janeiro e trabalhando na indústria aproximou-se das lutas operárias e suas conexões políticas. Dado o contexto repressivo da época decidiu sair do país para estudos na União Soviética. A experiência de vida sob o regime soviético, combinado com o fracasso da “via pacífica ao socialismo” e a tragédia do golpe no Chile, estimularam a busca por novas alternativas de esquerda. Aderiu ao movimento trotskista internacional durante o trabalho entre os exiliados latino-americanos na Europa e participou da fundação da Liga Socialista na Suécia, filiada à LIT-QI. Após a volta ao Brasil, integrou a direção da Convergência Socialista e foi membro do Diretório do PT de Diadema/SP.