Deputado Glauber, você ingressou com um mandado de segurança no STF sobre a falta de transparência na destinação dos R$ 4,2 bilhões em emendas. Poderia detalhar quais aspectos específicos do processo de alocação de recursos você considera mais graves e em que medida violam a Constituição?
O mandado de segurança teve um objeto específico. O não respeito por parte de Arthur Lira de decisões do STF que exigiam transparência e o desrespeito também da legislação sobre emendas que tinha sido aprovada pela própria Câmara. Ele desmarcou as comissões na última semana pra evitar a decisão dos colegiados sobre a destinação dos recursos e fez uma articulação mandando um ofício pro governo assinado por líderes pra dizer que verbas deveriam ser liberadas. Na prática ele substituiu as emendas de relator por esse documento assinado por líderes partidários. É uma fraude, já que na prática é a continuidade do orçamento secreto em outros termos, e é também uma tentativa de intimidação ao ministro Flávio Dino. Ele imaginou que o conjunto dessas assinaturas geraria uma pressão política irresistível pra manter a fraude.
Você mencionou a ausência de consulta às comissões temáticas do Congresso no processo de destinação das emendas. Qual é a importância dessas comissões que respeita à transparência e a legalidade orçamentária, e como isso impacta a credibilidade das duas Casas?
Se são emendas de comissão, o mínimo é que sejam discutidas pelas comissões. Isso é o básico do básico. É mais um elemento a desmoralizar a credibilidade de um congresso que tem sido marcado pelas arbitrariedades de Arthur Lira.
Precisamos derrotar a extrema direita no Brasil, ainda mais depois da vitória de Trump, e isso se faz com mobilização a quente
Alguns parlamentares argumentam que o bloqueio das emendas durante o recesso legislativo, e em meio à transição de lideranças no Congresso, é uma forma de interferência política. Como você responde a essas críticas e quais são as implicações desse cenário para a democracia?
Não tem interferência política nenhuma. O que tem é uma fraude escancarada e a partir daí uma solicitação de que decisões anteriores por transparência sejam respeitadas. Se de fato o inquérito que foi aberto pra apurar essa fraude for a fundo a responsabilização será inevitável. Essa farra com emendas parlamentares sem transparência tem que acabar.
Considerando sua atuação combativa no enfrentamento de irregularidades e sua defesa pela rastreabilidade no uso de recursos públicos, quais ações você acredita serem essenciais para garantir que emendas parlamentares sejam utilizadas de forma ética e em benefício de quem mais necessita?
Olha só, hoje o executivo tem aproximadamente 200 bilhões de recursos livres pra investimentos e novos projetos. O legislativo indica em torno de 50 bilhões em emendas. Isso é uma captura do orçamento público pra fins muitas vezes inconfessáveis. A melhor forma de garantir a aplicação dos recursos públicos da forma correta é envolvendo a população. Imaginem se esses 250 bilhões fossem definidos a partir de um projeto nacional de escuta e participação? O poder de figuras como Lira ficaria abalado. Pra isso tem que ter pressão nossa pra que essa proposta, que chegou a ser defendida na campanha, seja colocada em prática pelo governo.
Você considera que o alto índice de reeleição de prefeitos, no último processo eleitoral tem relação com o alto volume de emendas parlamentares?
Tem relação sim. A máquina do orçamento secreto favorece a reeleição de prefeitos que já estão no poder e apoiam os parlamentares que estão no esquema. Um outro aspecto que gostaria de registrar é a leniência com que determinados setores têm em relação a essa prática. Justificam o que é feito com o orçamento público por uma necessidade de se ter maioria parlamentar pra aprovar os projetos de arrocho enviados pelo executivo e cobrados pelo mercado. O fato é: precisamos derrotar a extrema direita no Brasil, ainda mais depois da vitória de Trump, e isso se faz com mobilização a quente. Ou enfrentamos o consórcio fascismo/neoliberalismo/centrão ou depois não vai adiantar chorar o leite derramado. Ou a esquerda se mobiliza com o povo, inclusive pra definir a destinação dos recursos públicos, ou iremos cair no buraco que já está na frente do nosso nariz.