Logo que foi anunciada para ocorrer em Belém, em novembro próximo, em plena região amazônica, a COP 30 vinha despertando muita expectativa de que pudesse superar o fiasco da COP 29, realizada em Baku, Azerbaijão, em novembro de 2024, e avançar de fato em compromissos efetivos dos países no enfrentamento da grave crise climática.
No entanto, ainda mais agora, depois da forte ofensiva tarifária e de chantagem política de Trump contra o Brasil, com o silêncio cúmplice da Europa, somada à aprovação do PL da Devastação, a COP 30 pode ocorrer natimorta, transformar-se em um grande teatro verde, sem força para votar resoluções que de fato venham a ser cumpridas ou impostas aos países mais poluidores.
Nela, dirigentes de países ricos e da ONU irão fazer belos discursos a favor do meio ambiente, enquanto no dia a dia continuarão a destruí-lo. Grupos capitalistas irão montar coloridos stands para mostrar exatamente o contrário do que fazem com a Natureza longe dos holofotes. A lentidão na mudança da matriz energética demonstra a farsa dos grupos capitalistas no combate à destruição que fazem no planeta.
Somado a isso, a burguesia hoteleira tratou de aproveitar o encontro apenas como um grande evento turístico, com diárias exorbitantes, que podem chegar a 10 vezes mais que o valor cobrado normalmente, ficando impeditivas para ambientalistas e estudiosos de outros estados do Brasil e do mundo, inclusive para vários chefes de Estado de países mais pobres. Por isso, alguns governos ameaçam não participar do encontro, chegando mesmo a pedir mudança do local da COP 30.
Ilustrando o caráter pouco sério e teatral que pode tomar conta do evento, os governos do Pará e de Belém, em vez de plantar árvores de verdade, decidiram instalar estruturas metálicas artificiais em formato de plantas no acesso ao local do evento. Literalmente uma piada, revelando ao mundo sua total incompreensão sobre a gravidade da situação climática no planeta.
O governo federal, por sua vez, vai praticamente militarizar toda a área da COP 30, impedindo que os movimentos ambientais e sociais sequer cheguem perto dos palcos do encontro.
PL da Devastação: um péssimo exemplo do Brasil no ano da COP 30
Não poderia haver pior sinalização do Brasil ao mundo no ano da COP 30 do que a aprovação de um projeto que vai completamente na contramão do combate às mudanças climáticas. O PL 2159/2021, que ficou conhecido como PL da Devastação, facilita o desmatamento, a degradação de muitos biomas, anistia crimes ambientais, podendo ampliar os conflitos socioambientais, ameaçando povos e comunidades tradicionais. Também vai reduzir a participação social e científica e a força dos organismos de controle ambiental, como o CONAMA, o IBAMA, o ICMBio.
Algumas das disposições do projeto são claramente inconstitucionais. Apesar de tudo isso, o governo do presidente Lula vetou apenas algumas delas, mantendo na prática sua essência, como um projeto que facilita a degradação ambiental, em benefício do agronegócio, dos desmatadores, pelo que recebeu fortes críticas de muitos ambientalistas e cientistas.
A aprovação desse projeto impacta negativamente a imagem internacional do Brasil exatamente no ano da COP 30, contribuindo para esvaziá-la e desacreditá-la, tornando as poucas resoluções que deverão ser aprovadas objeto de dúvida, no que tange à sua seriedade e real implementação pelas potências mais poluidoras.
Não poderia haver pior sinalização do Brasil ao mundo no ano da COP 30 do que a aprovação de um projeto que vai completamente na contramão do combate às mudanças climáticas.
O rápido agravamento da crise ambiental revela os limites do multilateralismo
Muitos governantes, inclusive o presidente Lula, têm falado bastante do multilateralismo como saída para as relações internacionais, especialmente nos últimos meses, frente aos arroubos e impostos de Trump e a agressão de Netanyahu ao povo palestino. No entanto, os novos problemas globais, como a questão ambiental e o surgimento de novos polos de poder, o massacre de Israel contra o povo palestino, com apoio dos EUA e silêncio cúmplice da Europa, demonstram os claros limites dessa visão.
Esse propalado multilateralismo, nascido em grande medida das instituições criadas na sequência da Segunda Guerra Mundial, no Sistema ONU, sob a égide dos EUA e da Europa Ocidental, vem demonstrando sua insuficiência e seu completo fracasso em lidar com os novos desafios mundiais, como a questão climática, a volta da desigualdade no mundo, derivada do neoliberalismo, novas guerras, como na Ucrânia, e o surgimento de novas potências e polos de poder político e econômico.
Expressões dessa crise de legitimidade das instituições do sistema multilateral da ONU são a inação e cumplicidade da Europa frente ao massacre praticado por Israel contra o povo palestino e a negativa dos países europeus e dos EUA em cumprir com seus compromissos financeiros para mitigar a crise ambiental global, assumidos no Acordo de Paris, um tratado internacional sobre alterações climáticas, aprovado em 2015, na COP21, na França.
São animadoras as crescentes mobilizações contra Trump dentro dos EUA, a greve geral em Israel contra Netanyahu, o boicote do povo canadense e europeus aos produtos norte-americanos, as grandes manifestações populares em diversos países em solidariedade ao povo palestino, a rejeição brasileira às chantagens de Trump
Os EUA e os países europeus insistem em manter o velho esquema, com o poder global concentrado em suas mãos. Mas o mundo cada vez mais multipolar e sua negativa em contribuir para efetivamente enfrentar os problemas mundiais levaram ao fracasso dessa falsa visão multilateralista. A ascensão econômica e política da China, o ressurgimento da Rússia como potência, a chegada da Índia ao páreo, a consolidação do BRICS, questionam aquele antigo esquema multilateral saído da Segunda Guerra Mundial.
Os novos impostos, as agressões de Trump contra muitos países, seus atropelos à ONU, os ataques ao Irã, as ameaças à Venezuela, com o deslocamento de uma frota para seu litoral, não revelam apenas força, mas a decadência do império norte-americano, como faz toda fera ferida. Em busca de salários mais baixos e lucros exorbitantes, as empresas norte-americanas transferiram nas últimas décadas suas plantas para a Ásia, levando à desindustrialização dos EUA. Hoje pagam o preço dessa opção, com o declínio do país.
Ao contrário do que prega Lula, não há saída para o mundo por essa via ilusória do falido multilateralismo e tampouco de um fictício plurilateralismo, que é a mesma coisa. A construção de um mundo melhor só poderá vir pela luta das massas populares, dos trabalhadores em todo o mundo.
Nesse sentido, são extremamente animadoras as crescentes mobilizações contra Trump dentro dos EUA, a recente greve geral em Israel contra Netanyahu, o boicote do povo canadense e de países europeus aos produtos norte-americanos, as grandes manifestações populares em diversos países em solidariedade ao povo palestino, a rejeição da população brasileira às chantagens de Trump contra o Brasil, para livrar Bolsonaro de seus crimes.
A saída é por outro caminho: a luta e a ação dos povos. Nesse momento, faz-se necessária uma ampla unidade dos povos do mundo para derrotar o imperialismo estadunidense e seus aliados, colocando na ordem do dia as pautas da classe trabalhadora e a defesa da vida. E isso passa também pela pauta ambiental.
Sair do papel e dos belos discursos
No terreno ambiental, não se pode esperar muito dos governos capitalistas e das organizações alinhadas com o capital. O planeta e a vida pedem urgência, socorro. É preciso que o governo brasileiro e especialmente as organizações e movimentos sociais tratem o tema com a devida prioridade, o que não ocorreu até agora.
A construção de um mundo melhor só poderá vir pela luta das massas populares, dos trabalhadores em todo o mundo.
Muitas organizações anunciam planos mirabolantes de plantio ou controle de emissões, mas seus planos não saem do papel. Esse é o caso da The Nature Conservancy (TNC), que divulgou um projeto fantasioso de plantio de 1 bilhão de árvores no Brasil, alinhando-se aos objetivos das COPs, mas que não avançou em quase nada.
No entanto, existem iniciativas concretas de organizações sociais e projetos ambientais ocorrendo silenciosamente, por todo mundo e inclusive no Brasil. Uma série de exemplos demonstra que, quando há interesse político, a pauta avança.
Um deles é o que ocorreu recentemente em Burkina Faso, que, sob a orientação de seu governo, plantou 5 milhões de mudas em um único dia, em junho desse ano, envolvendo toda a população, para combater a desertificação e a insegurança alimentar, aliando o plantio à técnica “zai”, de construção de grandes covas de captação de água e ao plantio de moringas oleíferas, plantas nutritivas e muito resistentes à seca. O país também tem participado, junto a outros países, da iniciativa Muralhas Verdes, que está plantando milhões de árvores ao longo de toda orla sul do deserto do Saara, para impedir seu avanço.
Outro exemplo, aqui no Brasil, é o caso do Projeto Arboriza RN, mantido no âmbito da UFRN, que, baseado no trabalho voluntário de centenas de pessoas, produziu e distribuiu gratuitamente para plantio, somente nos últimos quatro anos, mais de 300.000 mudas, para Natal e mais de 100 cidades no estado.
Mais um exemplo, no mesmo estado, é a Conferência Potiguar do Clima, também COP, que aprovou a produção e plantio de 5 milhões de mudas no semiárido do estado, para o que estão sendo instalados progressivamente viveiros em todos os campi dos IFRN. Como seria de se esperar, o projeto encontra muitas dificuldades, como a falta de apoio e a incompreensão do governo estadual do PT para sua importância. Mas, mesmo assim, avança silenciosamente. A COP RN já vai em sua segunda edição, na qual reuniu 1500 delegados. Entre as COPs, ocorrem as ASCOPs, Assembleias Potiguares do Clima, que acontecem de forma itinerante nos municípios do sertão, e que já vai em sua quinta edição.
A conclusão de tudo que dizemos nesse artigo é que as organizações sociais e entidades dos trabalhadores precisam de fato assumir o desafio de enfrentar a rápida degradação ambiental do planeta, com ações concretas, sem deixar tal tarefa por conta de organizações e governos capitalistas, que seguem fazendo apenas discursos verdes, demagogia, como veremos mais uma vez na COP de Belém, mas que na prática continuarão destruindo nossa casa comum.

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Professor da UFRN (Universidade Federal do Rio Grande do Norte). Ex-vereador de Natal. Fundador do PSOL.
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É militante da corrente Fortalecer o PSOL, membro do Diretório Municpal do PSOL Natal e voluntário no Projeto Arboriza RN.





